top of page

Ondas de desmotivação e nostalgia

  • Maria João Gonçalves
  • 10 de abr. de 2021
  • 7 min de leitura

Hoje falo-vos da minha perspetiva enquanto estudante, em especial enquanto estudante finalista que está atualmente a escrever a dissertação e a fazer o estágio curricular. O tsunami mental que tem ondulado pela minha mente ultimamente tem sido a desmotivação. Ainda que em momentos diferentes do percurso escolar, acredito que muitos estudantes estão a passar pelo mesmo sentimento que eu e, de alguma forma, creio que em certa medida também os restantes se possam identificar.


Estamos a passar pelos últimos meses do presente ano letivo. Para uns passou muito rápido, mas para outros tudo se desenrolou demasiado lentamente. Para muitos são os últimos momentos de avaliação, as últimas oportunidades para subir notas, fazer "cadeiras", estudar para os exames. São meses de decisões e indecisões para quem termina um ciclo de estudos, seja ele qual for, 3º ciclo, ensino secundário ou o ensino superior, como é o meu caso, há muitos sentimentos envolvidos. Medo, incerteza, ansiedade, entusiasmo, felicidade, alívio, orgulho, realização. A mudança está prestes a bater-nos à porta, com uma bela dose de desconhecido para nos servir. Isso é assustador e stressante.


No entanto, hoje quero-vos falar de desmotivação, porque acho que à medida que os dias passam e os trabalhos e entregas se apertam, acumulam e adensam, esta onda mental tem vindo a sofrer algumas variações. Em alguns dias, menos do que gostaria, está calma, mas noutros dias, cada vez mais frequentes, lá surgem ondas maiores de desmotivação, que por vezes, perante sismos de incerteza, originam destrutivos tsunamis mentais. Perante estas ondas paro, bloqueio, sinto-me inundada, levada pela corrente, a uma boa distância do ponto do caminho em que estava, com destino aos meus objetivos. Quando estas ondas recuam, muitas vezes o que fica é a procrastinação. Pois é, a desmotivação e a procrastinação andam de mãos dadas, habitam o mesmo mar e muitas vezes desaguam conjuntamente na nossa vida.


Quando dou por mim, estou desfocada e já não vejo por entre as tarefas que tenho e se multiplicam, que ao fim ao cabo são apenas pequenas frações dos objetivos que tracei para mim. Não sei por onde começar, por onde pegar, como se esta onda que rebentou na minha mente me tivesse tornado mais pequena ou tivesse ampliado os meus objetivos. Protelo as tarefas e os compromissos, refugio-me nas poucas tarefas que, no meio de tantas, me dão mais gosto e vou chutando para o lado as que mais me desafiam, as que passaram a assustar-me pela desproporcionalidade que ganharam na minha mente.


Os dias não são todos assim, felizmente, mas quando estas ondas mais violentas aparecem é preciso alguma ginástica para voltar a ganhar a perspetiva certa das coisas. E é isto que vos tento passar hoje. Sinto que muitas vezes perco o foco, como mencionei, esqueço-me ou faço por não me lembrar do porquê de estar neste caminho. A verdade é que muitos dos objetivos, se não todos, que queremos atingir dão trabalho e é bastante provável que partes do processo sejam mais aborrecidas do que outras, que nos dêem menos gosto e que sejam aquelas que temos maior tendência para empurrar para o fundo da nossa lista de prioridades. Porém, elas fazem parte do percurso, quase como um puzzle, mas um que se pode montar de diferentes formas e ter várias possíveis soluções, porque a realidade é que existem vários caminhos para o mesmo destino. Assim, mesmo as partes mais aborrecidas, desafiantes, as que nos fazem suar física ou mentalmente, que nos fazem querer adiar ou desistir do puzzle, fazem parte dele e têm de ser ultrapassadas. É preciso mantermos o nosso foco. Porque é que começámos? De que forma é que esta tarefa ou fase mais complicada vai contribuir positivamente para o objetivo final? No meio de tanto que não gosto, o que é que posso tirar de bom? O que estou a aprender? O que é que estou a adquirir? De que forma posso tornar esta tarefa menos agradável, em algo que me motive um pouco mais?


Todos nós já passámos por desafios que nos pareciam enormes, altamente desproporcionais às poucas competências que achávamos, erradamente, que tínhamos. Todos já tivemos nessa situação e a ultrapassámos e quando olhámos para trás ou quando finalmente ficou concluída, pensámos "afinal não era assim tão complicado". No entanto, sei que isso é no pós, quando o alívio e outros sentimentos nos inundam. Ainda assim, é importante não esquecermos esses momentos, essas ocasiões em que conseguimos lutar contra as adversidades, sejam elas quais forem, derrotámos a desmotivação quando ela surgiu, adiámos a procrastinação e chegámos onde queríamos. É muitas vezes a isso que me agarro, penso nos trabalhos que já fiz, nos momentos em que duvidei de mim, me questionei se era capaz e fui e consegui, mesmo que tenha sido depois de uma ou duas ou mais tentativas. Agarra-te aos sucessos que já tiveste, ao que já correu bem, pensa no que poderá ter feito a diferença durante as fases mais tumultuosas desses outros projetos e objetivos que alcançaste.


Deixo aqui algumas das dicas que tento colocar em prática na minha vida académica e também noutras áreas da minha vida. Nem todos os dias derroto a procrastinação, em alguns dias encosto a prancha e deixo a onda da desmotivação levar-me. Nos dias em que o mar está mais inquieto, são algumas das coisas que estão em baixo que me ajudam a voltar para cima da prancha e surfar estas ondas maiores.


Se trabalhar sozinho rega esta desmotivação, tenta juntar-te com alguém, um colega ou amigo (cumprindo o distanciamento e as restantes regras) para que possam, pelo menos partilhar os momentos mais difíceis. Mesmo que seja a fazer trabalhos diferentes, é bom sentir que alguém está nesta "luta". Pode ser útil para nos focarmos no objetivo que traçámos para aquele momento e resistir à tentação de nos agarrarmos aos telemóveis ou abrir um separador no computador para o youtube ou o netflix. Ter alguém connosco ou recorrer a uma videochamada nos momentos mais exigentes, em que nos sentimos mais pressionados e prestes a existir, é bom termos a possibilidade de partilhar esse sentimento com alguém. Existe conforto em saber que não somos os únicos em dificuldade, que não somos os únicos que somos visitados pela desmotivação ou qualquer outro obstáculo.


Listas. Faz listas dos teus grandes objetivos e divide-os em tarefas mais pequenas, passos pelos quais tens de passar para os alcançar. Se alguma tarefa te parece muito complexa ou te faz sentir assoberbado, de que forma poderás "partir" essa tarefa em pequenos passos, mais concretizáveis, que te ajudem a começar por algum lado? Muitas vezes, quando as tarefas se multiplicam e se acumulam, o problema está mesmo aqui, em saber por onde começar. Pequenos passos tornam as tarefas mais fáceis de processar e ajudam-nos a percecioná-las como mais exequíveis. Por exemplo, sendo um dos meus grandes objetivos terminar a minha dissertação de mestrado, colocar uma tarefa apenas como "escrever a dissertação" seria altamente stressante, até porque são várias as fases que compõem este empreendimento. Dividir este objetivo tão abrangente nas diferentes fases, desde o enquadramento, metodologia, resultados, etc, ajuda a organizar o processo. Além disso, cada uma destas fases é composta por vários passos e pegar em cada um deles de cada vez ajuda a acalmar as ondas mentais.


Nestes momentos em que temos tanto para fazer, em que nos sentimos tão perdidos, acabamos por entrar num mindset de "tenho de me dedicar a isto a 100%", anulamos as pausas e momentos de lazer, como se fossemos capazes de estar sempre a trabalhar, oscilando entre tarefas e diferentes objetivos. Porém, é claramente impossível passar um dia a trabalhar, 100% focado e concentrado. Aliás, isto é altamente contraproducente e insustentável, quando damos conta chegámos à exaustão, já não conseguimos lembrar-nos bem do porquê de estarmos a fazer aquilo e somos atacados pela procrastinação, sendo que que atolámos o nosso cérebro de tal forma que ele não terá conseguido absorver tudo ou pelo menos tudo corretamente. Começamos a duvidar de nós e quando damos conta estamos a devorar uma série numa assentada. As pausas são essenciais, os momentos de lazer também e devem fazer parte de uma rotina que se pretende produtiva, para que não oscilemos entre dois polos, um em que não descolamos do trabalho e o outro em que simplesmente desligamos de tudo e as coisas começam a acumular-se. É importante reservarmos vários momentos ao longo do dia em que não estamos a trabalhar nem a pensar nessa esfera da nossa vida, em que podemos dedicar-nos ao lazer e deixar a nossa mente descansar.


Dicas à parte, são tempos estranhos. Estes meses que passaram e os que se avizinha já se previam suficientemente desafiantes, mas com a pandemia e os confinamentos tornaram-se ainda mais complicados. Creio que parte desta desmotivação que me bloqueia surge também porque, de alguma forma, quero adiar a despedida desta realidade que tão bem conheço e do seu conforto. Fui estudante durante 17 anos, não sei se sei ser outra coisa, terei de aprender, ainda que tenha consciência de que serei estudante toda a minha vida, aliás a minha futura profissão assim o exige e ainda bem. No entanto, é um sentimento estranho, onde a nostalgia, o medo pelo desconhecido e o entusiasmo por começar uma nova fase se fundem e misturam.


Sou estudante finalista em Coimbra, a cidade dos estudantes, mas também a cidade da saudade, o lugar que me acolheu há 5 anos e que me trouxe das maiores e melhores aprendizagens, assim como amigos que levo para a minha vida porque se tornaram a minha família. Lá está, acho que passei todos estes anos a planear mentalmente este ano letivo, seria o último, provavelmente o mais trabalhoso e desafiante (confirma-se), mas também aquele em que iria aproveitar ao máximo o resto que este percurso tinha para me oferecer. Assim, as bolsas de ar e alegria que seriam as festas académicas, os convívios, os jantares e encontros não planeados nos claustros da mais bonita faculdade de Coimbra, foram rebentadas tal e qual uma agulha que fura um balão. E de alguma forma sinto que existe em mim alguma resistência em perspetivar esta despedida, o fim deste tão bonito percurso, porque sinto que esta pandemia nos roubou tanta coisa, tanta gente, tanta experiência e levou consigo a possibilidade de nós, estudantes finalistas, nos despedirmos desta história tão especial que vamos contar para sempre, até que a nossa memória nos permita.


Assim, o ano de finalista que sonhei como sendo um ano de ginástica entre diversão à grande e trabalho intenso, passou a concentrar-se apenas na segunda parte. A verdade é que já sinto saudades e sobretudo algum inconformismo, porque não era assim que me queria despedir da minha vida de estudante, nem acho que seja a forma que honra este meu percurso. Tenho plena consciência que o principal foco atualmente é a saúde pública e há coisas mais importantes e urgentes neste momento, esta é só mais uma perspetiva e dose de desafios que a pandemia nos trouxe. Sei que, eventualmente, mais cedo ou mais tarde, me irei despedir adequadamente desta cidade que será para sempre casa para mim e das minhas melhores memórias.


A última dica: estudantes aproveitem tudo ao máximo, passa num instante.


Da ligeiramente mais motivada, mas duplamente mais saudosista,

Maria João.

 
 
 

Comments


  • Instagram

©2021 por Tsunamis Mentais. Orgulhosamente criado com Wix.com

bottom of page